Sarau das Mina e a luta pelo espaço da mulher na arte
- Mábia Almeida

- 20 de jul. de 2020
- 4 min de leitura
Integrantes do coletivo abordam, em suas apresentações, temas femininas do dia a dia

Um grupo de mulheres, que sempre frequentava saraus, começou a perceber que sempre tinha mais homens nas apresentações artísticas, e mais que isso, elas se sentiam incomodadas com o comportamento abusivo de alguns. A partir desse momento nasceu a necessidade de ter o protagonismo e pautas voltadas ao público feminino, assim nasceu o Sarau das Mina.
Sarau das Mina se denomina como uma coletiva (sim, no feminino), é composta por mulheres com o objetivo de dar voz e um espaço seguro para as artistas e as participantes do evento. Criado em 2015, realizam suas apresentações no bairro do Grajaú, zona Sul de São Paulo.
Através de música, teatro, dança, poesia e performance, o sarau aborda questões de interesse feminino, como: gênero, maternidade, padrões estéticos, empreendedorismo, políticas públicas, entre outros. Conversei com Carol Leone (por mensagens no WhatsApp), fotógrafa e participante do coletivo, sobre o trabalho que o Sarau das Mina realiza com as mulheres.
Como surgiu o Sarau das Mina? conta um pouquinho da sua história.
O sarau nasceu a partir do coletivo mulheres na luta, que era um coletivo de mulheres que atuava na região do Grajaú com rodas de conversa e oficinas. A gente frequentava os saraus e sempre tinham mais homens que recitavam do que mulheres. Também sempre tinham homens que davam em cima de todo mundo e a gente achava isso muito abusivo, então decidimos fazer um sarau de mulheres onde estivéssemos seguras. E onde fôssemos apoiadas em nossas escritas e tivéssemos o protagonismo de fala para trazer nossas questões, dores e reflexões.

Vocês encontram dificuldades em fazer trabalhos voltados a dar voz ao público feminino? Quais?
sim, dificuldade de recursos, e dificuldade em conseguir as vezes abranger muitas mulheres e criar espaço em que os homens não queiram dominar. Por algum tempo no início percebemos que os homens estavam indo no nosso sarau e quando recitavam roubavam a cena, e também davam em cima das mulheres que estavam lá. Então, esse trabalho de desintoxicação do nosso espaço levou um certo tempo, mas homens são sempre bem vindos, mas exigimos que sejam respeitosos e que compreendam que ali o protagonismo é das manas.
Você enxerga uma mudança positiva nas mulheres que frequentam e se apresentam no “Sarau das Mina”?
É mais do que poesia, o sarau forma laços que levamos para toda vida, mesmo sabendo que algumas frequentadoras não são poetas ou não recitam, sentimentos, a vibração positiva, a troca de conhecimento, afeto, experiências de vida. Embora seja um evento mensal é como se elas estivessem em casa, procuramos ser acolhedoras e pensar como podemos ajudar essas mulheres mesmo que seja nos pequenos detalhes, como por exemplo, o espaço kids que faz com que as mães solos consigam frequentar o sarau sem precisar deixar o seu filho(a) com outra pessoa. Além disso, há também uma rede de empreendedorismo feminino, onde as mulheres expõem suas artes, e temos de tudo um pouco, desde livro a tatuadora, é uma forma do público em um modo geral consumir arte feita exclusivamente por mulheres, e passar a indicar essas artistas para outras pessoas.
"Como em todas as áreas os homens dominam a cena, e na arte não seria diferente. Aos poucos estamos mudando esse cenário"
Como você enxerga a arte e a luta da mulher contra o machismo no Brasil nos dias de hoje?
Como em todas as áreas os homens dominam a cena, e na arte não seria diferente. Aos poucos estamos mudando esse cenário.Existem muitos coletivos que são administrados apenas por mulheres assim como o sarau das mina, e que é voltado para o desenvolvimento de artistas mulheres. O combate ao machismo consiste em fazer com os homens participem de espaços que são voltados para mulheres, desde que entendam que esse é o lugar de fala da mulher, que reflitam sobre a importância de indicar e consumir arte feitas por mulheres, temos que ir à raiz do problema para resolvê-los. É uma desconstrução diária e necessária, não apenas para a arte, mas para melhor harmonia em todas as áreas.
"Diariamente somos reprimidas pelo simples fato de ser mulher, a sociedade espera coisas das mulheres que não condizem com a realidade".
De que forma, vocês entendem, que a arte pode ajudar a nós mulheres?
Diariamente somos reprimidas pelo simples fato de ser mulher, a sociedade espera coisas das mulheres que não condizem com a realidade. Acreditamos que a arte é mais do que uma fuga dessa chuva de julgamentos, é também a única forma de liberdade para expressar e externar o que sentimos com relação a tantas situações que nos impõem. A arte é a cura da alma e mente.
O quanto o covid-19 alterou a forma de se fazer o sarau? Quais medidas foram tomadas para continuar oferecendo seu conteúdo ao público mesmo na quarentena.
A pandemia nos obrigou a fazer uma adaptação on-line e totalmente remota, de casa. Temos a sensação de que quando estamos em casa tudo se mistura, não existe um tempo linear, são afazeres domésticos, criança e animais para cuidar, trabalhos externos e ainda ter que parar para se dedicar ao projeto. Infelizmente não chegamos a realizar nenhum sarau no formato de live, por dificuldades técnicas mesmo, como moradoras da periferia sentimos o quanto a falta de recursos nos fez adiar o que mais gostamos de fazer que é arte. Mesmo assim, conseguimos fazer dois bate papos com duas convidadas, o primeiro com a Michele Santos que é uma poeta muito importante da região do Grajaú, e o segundo com a Viviane Juruna, que falou um pouco sobre maternidade na quarentena e empreendedorismo periférico. Estamos estudando juntas em como voltar a fazer o sarau e bate papo no formato online, trabalhando com os recursos que temos.
O grupo se apresenta, geralmente, uma vez por mês de forma itinerante. Antes da pandemia o evento acontecia no espaço Grajabee Pub, no Grajaú. O coletivo está nas redes sociais como @coletivasaraudasmina no Facebook, e Instagram como saraudasmina.
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